segunda-feira, 16 de outubro de 2017

Descensum: A Viagem ao Inferno

Então você viu a terceira temporada de AHS (Coven) e resolveu acreditar nisso?! Não. Esse é um processo ritualístico existente e antigo, porém destinto do que é retratado na série, embora seja uma considerável ilustração ao "roteiro" real. Recomendo a leitura do texto recém postado sobre "Trabalhos com Demônios na Bruxaria Tradicional", pois mais uma vez nos voltamos para a misteriosa Stregoneria (...).


Como explanei no texto sobre trabalhos com demônios a palavra Inferno se origina do termo em latim infernus ou infernum que se refere etimologicamente a um outro mundo que estaria INFERior ao nosso. Ao traduzir a bíblia judaico-cristã de aramaico e hebraico para o latim (idiomas muito distintos) os tradutores acharam que a melhor palavra para rotular seu suposto submundo cristão seria Infernum, mas, como sabemos, a cultura hebreia foi diretamente influenciada pelas religiões politeístas egípcia, suméria e fenícia (e, mais tarde, pela cultura helenística greco-romana), por tanto, o inferno hebreu é um plágio do Duat egípcio. Essa breve explicação é a chave para desvincularmos nossa compreensão de Inferno aqui da visão cristã sobre o mesmo atualmente popularizada.

Na Stregoneria e religião romana o Inferno é apenas o submundo dos antigos italianos e seus povos indígenas, ou seja, trata-se de um reino dos mortos tal como o Hades dos gregos e o Hel para os nórdicos. Na cultura grega, próximo ao Hades está o Tártaros que podemos descrever com a ala densa, tortuosa e perigosa desse mundo mórbido; na cultura nórdica, a baixo do Hel ainda há o Niflhel que é exatamente similar ao Tártaros, ou seja, é onde está o ardente caldeirão de Hel fervendo as almas malditas; no Infernum italiano não é diferente, existe também uma ala pouco recomendada para se estar, mas no geral (80%) é apenas o reino dos mortos.


O daemon mais conhecido e que, por sua vez, acaba - as vezes - dando nome ao próprio Inferno é Orco. Um dos daemones mais poderosos e regente da morte que é retratado em imagens etruscas como um homem barbado as vezes confundido com Plutão pelos mais leigos na popular religião romana. Também descrito (Orco) como "Irmão da Noite" nos textos de Virgílio em referência ao seu poder em trevas. Mas, além do substantivo infernus, este mundo inferior também era chamado de Averno.

Lêmures é o termo dado para espíritos malfazejos na cultura italiana, são espíritos que negam-se a ir para o Inferno, pois sabem que serão destinados à ala tortuosa onde ficariam perdidas em sofrimento até conseguirem energia (ou apoio energético) para ascender para os "andares" da ala mais tranquila e, para isso, precisam trabalhar arduamente e aprender a "jogar" com os demônios.

Descensum é citado e ilustrado em alguns poemas e lendas da Idade Antiga tanto gregos quanto romanos. Na Odisséia de Homero Odisseu é orientado pela bruxa Circe e pelo Vento-Norte (Bóreas) a descer com seu barco ao Hades para buscar o espírito de uma pessoa morta; Na Eneida de Virgílio Enéias vai ao "reino de Plutão" guiado pela sacerdotisa de Febus. Na Stregoneria descer ao Inferno é um passo importante, processual e - obviamente - perigoso, logo, para ser feito é preciso ter sido evidentemente preparado ao longo do tempo a nível energético, intelectual e espiritual.



O aspecto "processual" do Descensum fica claro quando entendemos o Uestibulum Infernales que podemos ilustrar como os andares de um edifício que são organizados de acordo com as questões humanas em torno da morte: Luctus (Remorso), Morbus (Enfermidade), Senectus Tristi (Velhice), Metus (Medo) e Egestas (Pobreza). Virgílio nomeia esses "andares" de Umbrais (tendo escrito seus textos muito antes de o Espiritismo sonhar em existir...), nos primeiros umbrais estão as almas das crianças tiradas - pela morte - precocemente de suas mães, os condenados à morte por crimes terrenos são julgados em tribunais presididos pelos Minos (Juízes); nos umbrais posteriores estão os que se deixaram destruir pelo amor onde, segundo Virgílio, está a árvore sagrada de Vênus; nos umbrais mais à baixo estão os suicidas que vivem sem o almejado "sossego" sonhado no ato; mas é no mais inferior e oculto dos umbrais que está a bifurcação entre os caminhos dos umbrais comuns (antes citados) para dois caminhos: Os Campos Tranquilos -à direita- e o Extremo Umbral -à esquerda- (também citados na cultura helenística como Campos Elísios e Tártaros) sendo totalmente distinta daquela famosa ideia onde o "paraíso" estaria no Céu ou seria Superior.


A bruxa arcaica, semelhante aos heróis de Homero e Virgílio, possui várias razões para descer ao Inferno ligadas à conquistas e revelações que estão ligadas famosa máxima délfica "Conheça a Ti Mesmo" também presente (de forma semelhante, e não igual) na Stregoneria, mas não existe um Inferno Pessoal, essa é apenas uma metáfora para o quão a bruxa conhecerá a suas próprias sombras após sua descida. Há inúmeros mistérios e detalhes sobre esta questão que não revelarei aqui, contudo, todo esse texto abre portas para uma larga compreensão e desconstrução do Inferno na Bruxaria. Escrevi textos mais aprofundados sobre este lado oculto da Stregoneria, Daemones e Inferno no curso MAGIA REAL, para ampliar seus estudos e entender melhor as bases e os procedimentos recomendo o curso. Para adquiri-lo entre em contato pelo whatsapp 051 9577-6891.


- ROBERTO DE SOUZA 

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